quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Campylobacter e a Síndrome de Guillain-Barré

No simpósio da Fundação Internacional de GBS e CIDP, vários médicos e cientistas mencionaram a relação entre a Campylobacter jejuni e a Síndrome de Guillain-Barré. No estudo IGOS que pretende arrolar 1000 pacientes de GBS, os resultados preliminares indicam que 25% dos casos aparecem após uma diarreia causada pela Campylobacter jejuni.

A Campylobacter é uma bactéria que vive no intestino de aves domésticas, mas pode também estar presente na carne de boi. Já vi alguns médicos de referirem a ela como a 'bactéria do frango'. Ela causa infecção intestinal, dores no abdômen e diarreia. E o que é interessante é que muitas pessoas que tiveram diarreia desenvolveram também a GBS no prazo de 4 semanas. E quando eu paro para analisar a minha carreira na CIDP, eu vejo que os episódios mais drásticos foram após uma diarreia. Não foi assim na primeira vez, quando eu descobri que tinha GBS em 2006, mas foi exatamente assim das outras vezes.

As recomendações são:

Não misture a preparação do frango com outras comidas que não serão cozidas.
Não use a mesma faca para cortar o frango e depois preparar as saladas.
Não lave o frango na hora da preparação para que as bactérias não se espalhem para outras comidas.

A Fundação presenteou a cientista Dra. Ruth Huizinga do Departamento de Imunologia do Erasmus Medical center, Universidade de Rotterdam na Holanda, com uma bolsa de pesquisa,  a Benson Fellowship, no valor de 450 mil dólares divididos em três anos, para que a Dra continue com sua pesquisa.

O que a Dra Huizinga quer descobrir é por quê a Campylobacter jejuni desencadeia GBS em algumas pessoas e em outras não. Afinal, não são todas as pessoas que desenvolvem GBS após uma infecção intestinal com a C. jejuni (ainda bem!). Existe algo nos pacientes de GBS que faz com que as células protetoras do corpo combatam a bactéria, mas depois pensem que a mielina dos nervos é a própria C. jejuni e passem a atacar os nervos. Esse mecanismo ainda não foi explicado.

Se a Dra. Huizinga conseguir decifrar esse mecanismo, as empresas farmacêuticas poderão criar novos medicamentos e quem sabe até curar a GBS e CIDP de uma vez por todas.

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Simpósio da Fundação Internacional de GBS e CIDP



Na semana passada ocorreu em Orlando o décimo terceiro Simpósio Internacional da Fundação Internacional de GBS e CIDP.  A Fundação realiza um simpósio a cada dois anos.

Mais de 600 pessoas, entre pacientes e cuidadores da Síndrome de Guillain-Barré (GBS) e de CIDP, Polineuropatia Desmielinizante Inflamatória Crônica, se reuniram no Coronado Springs Resort no coração da DisneyWorld, não somente para passear, mas principalmente para aprender. Muitas dessas pessoas vieram de outros países do mundo: Itália, Nepal, Filipinas, Trinidad-Tobago, Quênia, França, Alemanha, México, entre outros. Eu participei como representante brasileiro da Fundação. 

O objetivo do simpósio foi principalmente informar,  apresentar aos pacientes e cuidadores a ciência por trás dessas doenças, os avanços que estão sendo feitos na área, os resultados de estudos conduzidos por vários médicos de vários países e também promover a integração entre os pacientes.

Eu, particularmente, fiquei muito feliz em encontrar pacientes de todos esses países e saber que eu não estou sozinho. Sim, acho que esse foi um dos grandes benefícios para a minha vida.

É claro que eu conheço outros pacientes brasileiros pessoalmente e que já falei com outros tantos. Mas num evento como esse, eu vi quantas e quantas pessoas passam pelos mesmos problemas e desafios que eu, vi que temos muito em comum, vi o que as doenças causaram a eles e como têm levado a vida, pude ver também o que o futuro reserva observando as pessoas mais velhas na sua grande maioria, vi também quantas e quantas pessoas trabalham para levar informação para pacientes e cuidadores com dedicação inabalável.

Nos próximos postings eu vou escrever sobre cada coisa que achei importante, sobre cada sessão e compartilhar informações que podem melhorar a vida dos nossos pacientes brasileiros.

Representantes Internacionais da Fundação GBS/CIDP

O melhor mesmo será um evento que estou programando para os pacientes e cuidadores, onde pretendo aplicar um pouco do que eu vi lá nos EUA e agitar a comunidade para beneficiar todos nós.

Lembre-se: VOCÊ NÃO ESTÁ SOZINHO!

Melhoras!

Marcio Pocciotti

sábado, 27 de setembro de 2014

Alunos do Ensino Fundamental e a Polirradiculoneurite

Alunos do Colégio Divino Salvador de Jundiaí fazem pesquisa sobre imunologia e escolhem a Polineuropatia Inflamatória Desmielinizante Crônica como tema.

Veja também o video no final; é um resumo sobre a doença. (dê um clique sobre o vídeo para iniciar)



Crises Alérgicas na Polirradiculoneurite

Após oito anos recebendo imunoglobulinas e outras medicações, é razoável que o corpo muda. Imagine  receber imunoglobulinas, solumedrol (corticoides), Benadryl, Pantoprazol, Dipirona e outras medicações direto na veia por anos e anos, além de gapapentina, azatyoprina, anti-inflamatórios, fampyra, mestinon e tantos outros remédios que nem dá pra lembrar, por via oral. Tudo isso vai para dentro do seu organismo. É natural que com o passar dos anos o próprio organismo desenvolva algum tipo de tolerância a essas coisas.

No meu caso, acabou sendo a própria imunoglobulina. É irônico! O único medicamento que me mantém de pé e andando é o próprio que meu corpo agora tenta rejeitar.

Nas penúltima IVIG, após o terceiro dia de imunos, 40g por dia em 400 ml, eu comecei a sentir calafrios e tremedeiras, 1 hora depois do início da infusão. Os pés e braços ficaram gelados, dores na nuca e na coluna e a sensação de "não ter posição pra ficar", muitas dores pelo corpo, como numa gripe.

Eu já havia sentido isso antes na ocasião da mudança do fabricante da imuno, acho que foi de Sandoglobulina para Flebogama, se não me engano.

No início pensei que estava com frio, mas comecei a perceber que algo estava errado. O enfermeiro veio e disse que não era frio não, era um reação alérgica.

A infusão é interrompida imediatamente e um anti-alérgico é administrado: o Benadryl. Os sintomas desaparecem rápido.

No dia seguinte, mesmo com o anti-alérgico, soro extra para hidratar e Benadryl, os sintomas de calafrios voltaram após meia hora de infusão. Interrompemos de novo. Dos cinco dias previstos, cumpri apenas 3.

A dúvida ficou: será que não vai dar mais pra tomar imunoglobulinas, e agora?

O jeito era mesmo administrar anti-alérgicos antes das infusões em preparação.

Um mês depois viria a prova. Começamos com 500 ml de soro, depois Pantropazol (protetor gástrico), 500 ml de Solumedrol em 4 horas, uma ampola de Benadryl e finalmente Flebogama 40g em 800ml administrados em oito horas.

Já com um novo catéter central, o portocat (ou portacath), que é subcutâneo, a infusão ocorreu sem nenhum problema do começo ao fim. O primeiro dia foi somente soro e solumedrol. Depois, dois dias do novo "protocolo" das imunos.

Como de costume, os dias que se seguem à IVIG são de fraqueza, mas que passa logo do quarto dia.

Se tudo continuar assim, acho que vai dar para fazer mais alguns anos de IVIGs.

sábado, 2 de agosto de 2014

Síndrome de Guillain-Barré: Uma visão Geral


Tudo o que você precisa saber

A Síndrome de Guillain-Barré é uma doença inflamatória dos nervos periféricos. Não afeta o cérebro e nem a medula espinhal.
A incidência da Síndrome de Guillain-Barré (GBS, do inglês Guillain-Barré Syndrome) é de uma a duas pessoas por ano numa população de 100.000 na América do Norte e Europa. Há porém, uma maior incidência em áreas de Bangladesh e Índia, bem como em outros países ao redor do mundo que refletem as condições locais.

O que causa GBS?

Cinquenta a 80% dos casos são precedidos por uma infecção das vias respiratórias superiores ou por uma diarreia. Evidência substancial sugere que anticorpos no sangue,  estimulados por moléculas na superfície de vírus infecciosos e organismos, reagem com moléculas no nervo periférico. Esses anticorpos facilitam a ativação de moléculas chamadas complementos e células brancas do sangue chamadas macrófagos causando dano ao nervo periférico e resultando em fraqueza e perda sensorial.
A GBS é caracterizada pelo rápido acometimento de dormência, fraqueza e frequentemente a paralisia das pernas, braços, músculos respiratórios e face. A paralisia é ascendente, o que significa que ela começa nos dedos das mãos e dos pés e caminha em direção ao tronco.
A GBS ganhou atenção pública quando acometeu um número de pessoas que recebeu a vacina da gripe em 1976. Apesar de não aparecer muito nos noticiários hoje em dia, ela continua a fazer milhares de novas vítimas a cada ano, atingindo qualquer indivíduo de qualquer idade, independente de gênero ou raça.
O rápido aparecimento de sintomas, frequentemente acompanhados de sensações anormais (dormência, formigamento) que afetam os dois lados do corpo de maneira semelhante, é comum. Perda dos reflexos, como o reflexo dos joelhos, acontece geralmente.

Como a GBS é diagnosticada?

Para diagnosticar a GBS como a causa de fraqueza ou perda sensorial, três exames podem ser realizados:

1. Um exame neurológico.
2. Exames elétricos da funcionalidade dos nervos e músculos chamado Condução Nervosa e Eletromiografia (também conhecido como Eletroneuromiografia)
3. Exame do líquido da medula (ou líquor da medula ou líquido cefalorraquidiano).

Como é o tratamento da GBS?

A GBS é imprevisível nos seus estágios iniciais, portanto, exceto em casos muito leves, a maioria dos pacientes recém diagnosticados são hospitalizados para observação. Numa crise, o paciente com GBS pode ser admitido à UTI ou ser conectado à unidades de monitoração respiratória e de outras funções vitais até que a doença se estabilize. A troca de plasma (também conhecida como plasmaférese; um procedimento de “limpeza” do sangue) ou altas doses de imunoglobulina intravenosa são administradas com frequência visando diminuir a duração da GBS. A fase aguda progressiva da GBS varia tipicamente de alguns dias até 4 semanas, com mais de 90% dos pacientes passando à fase de reabilitação em quatro ou seis semanas. Períodos de hospitalização mais longos podem ser necessários se um paciente desenvolver uma infecção do sangue, pulmões ou rins. Cuidados com o paciente envolvem esforços coordenados de um time com neurologista, fisiatra, médico da família, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional, assistente social, enfermeiro e psicólogo ou psiquiatra. Alguns pacientes necessitam de um fonoaudiólogo em casos onde os músculos da fala são afetados.

Variações
Existem variantes da GBS, mas todas compartilham da característica de causarem ‘acometimento rápido’:
Polineuropatia Desmielinizante Inflamatória Aguda (AIDP): 75% - 80% dos casos na América do Norte e Europa caem nessa categoria “clássica” que afeta os nervos motores, sensoriais e autonômicos de maneira simétrica.
Neuropatia Axonal Motora Aguda (AMAN): Semelhante à AIDP, mas sem os sintomas sensoriais. Afeta os axônios motores dos nervos.
Neuropatia Axonal Sensorial Motora Aguda (AMSAN): Variante severa da GBS, prevalecente na Ásia, América Central e América do Sul. Causa uma severa e rápida destruição dos nervos ao longo de todo o corpo.
Síndrome de Miller Fisher: é caracterizada por visão dupla, perda do equilíbrio e perda dos reflexos dos tendões.
Vivendo com a GBS
A recuperação pode ocorrer num período de seis meses a dois anos ou mais. Uma consequência frustrante da GBS é a fadiga recorrente e de longo prazo bem como o cansaço e sensações anormais como dores em geral e nos músculos. Essas dores podem ser agravadas por atividades “normais” e podem ser aliviadas através do descanso e realização de atividades em etapas.

Simpósio sobre Síndrome de Gullian-Barré e Polirradiculoneurite

Há algum tempo eu havia escrito sobre a Fundação Internacional de GBS e CIDP que informa e ajuda pacientes e familiares em todo o mundo.

A Fundação Internacional de GBS e CIDP vai promover o seu 13o Simpósio Internacional em Orlando nos EUA de 31 de Outubro a 2 de Novembro de 2014.

O Simpósio Internacional é uma grande oportunidade para pacientes, familiares, médicos e experts interagirem. Serão 3 dias  palestras e workshops sobre GBS e CIDP e sessões de perguntas e respostas.

Eu acho que pacientes que já têm essas doenças por muitos anos, como eu, têm uma grande oportunidade de conhecer outros pacientes e médicos, quem sabe outros tratamentos disponíveis, trocar experiências, tirar dúvidas e fazer boas amizades.

Para saber mais sobre o Simpósio clique aqui.

Para fazer sua inscrição e escolher as palestras e workshops que quer participar clique aqui.

Eu já estou com meu passaporte pronto. Além de tudo vai ser num hotel lindo:

Disney’s Coronado Springs Resort.



Eu me tornei o representante da Fundação no Brasil e desde então tenho recebido contatos de muitos pacientes e familiares que vão até o website da Fundação procurando ajuda.

Se precisar de alguma ajuda fale comigo: mpocciot@gmail.com

Plasmaférese na Polirradiculoneurite Crônica - Recuperação

É até irônico falar de recuperação de uma Plasmaférese já que este é um tratamento para combater a GBS/CIDP. Mas o que aconteceu foi que a retirada do plasma sanguíneo diminuiu a quantidade de imunoglobulinas que ainda restava no organismo e a fraqueza aumentou rapidamente e de forma generalizada. Foi um resultado inverso ao esperado.

No final da segunda sessão eu estava me sentindo ainda pior do que quando cheguei ao hospital.

Então a pergunta era: por que meu organismo não respondeu à troca de plasma? Junto com o plasma, os anticorpos malignos não deviam ter saído?

Pois é, saíram e com eles o pouco da imuno que restava. Isso evidencia que, até agora, a única coisa que funciona (e já funcionou) foi a IVIG.

Decidimos parar com a Plasmaférese e começar com IVIG e corticoides. A IVIG pra levantar o organismo e os corticoides para diminuirem a inflamação.

Enquanto isso a fraqueza continuava grande. Sem andar, conseguindo ficar de pé apenas com a cama colocada na maior altura, sem quase conseguir me mover e me ajeitar na cama, aconteceu um episódio digno de videocassetadas. 

Meu pai veio ficar comigo alguns dias para ajudar. A orientação era sempre pedir ajuda aos técnicos de enfermagem para levantar e ir ao banheiro, mas é chato ter de depender deles toda hora. Pois bem, com ajuda eu fui ao banheiro sentado numa "cadeira" feita de canos de PVC que estaciona por cima do vaso sanitário, assim o paciente não precisa passar para o vaso. Fechei a porta do banheiro e fiquei lá, fazendo o que ninguém pode fazer por mim até terminar. Foi um custo para fazer a higiene, mas deu certo. Agora eu precisava voltar pra cama. Chamei meu pai para empurrar a cadeira até a beira da cama.
Como a cadeira era mais baixa do que a cama e só podia ser colocada paralela à cama, havia uma grande complexidade nessa manobra para passar de uma para outra. Ora, sem força nenhuma nas pernas, não dava para eu ficar de pé, pesando mais de 100 quilos, nem o meu pai consegui me por de pé para eu passar para a cama. O plano era ele me segurar pelos braços e na contagem de 3, me impulsionar para que eu conseguisse pelo menos sentar na beirada da cama. 

Tudo ensaiado, a contagem, os braços, etc., demos continuidade à operação: "1, 2, 3, já!" 

Acontece que o impulso não foi suficiente para que eu passasse da altura crítica, fiquei no meio do movimento, meu pai tentando me segurar, sem possibilidade de voltar para a cadeira e sem sentar na cama. Como ele também não tinha força suficiente para me por de pé a única maneira foi fazer o que fiz: fui abaixando devagarinho até sentar no chão com as pernas cruzadas. Detalhe: eu estava usando o avental do hospital e sem nada por baixo. O chão estava frio.

Fiquei lá sentado, sem lesão nenhuma, sem dor, sem força pra sair de lá. 

Chamamos as enfermeiras. Vieram três para ver o que havia ocorrido. 

Após dizer que estava tudo bem, blá, blá, blá, eu disse que precisava de ajuda para voltar pra cama e elas disseram que iam me levantar. Eu dei risada e disse: "Nem a pau vocês vão conseguir. Mandem chamar mais gente. Pelo menos mais 3 homens."

Uns minutos depois e time ficou completo. Um enfermeiro segurando em cada pé, outro em cada braço, outro no troco. Parecia uma cena do "Mega Construções" do Discovery Channel, onde aqueles guindastes enormes levantam partes inteiras de uma ponte. "1, 2, 3 e já!". Finalmente me levantaram, sem segurarem os urros e gemidos, e me colocaram de volta na cama.

Vejam só o resultado da fraqueza humana.

Dia seguinte à saída do hospital
Tive de fazer mais uma eletroneuromiografia. A terceira da minha vida, mesmo após ter prometido a mim mesmo que NUNCA MAIS iria fazer esse exame. Mas, como o Dr falou que era importante eu aceitei. Foi a pior de todas as vezes. As lágrimas de dor escorriam pelos cantos dos olhos sem pronunciar palavra. 

3 dias depois eu comecei a me sentir e me mexer melhor. Com a fisioterapia duas vezes por dia e exercícios.

Foi um total de mais de 15 dias no hospital. Voltei pra casa com o catéter para continuar as sessões de Rituximabe que comecei após a IVIG.

Fiz ainda outras 3 semanas de Rituximabe, para um total de 4 infusões. Tive de ser internado mais uma vez e depois outra para mais imunoglobulinas.

A ideia do Rituximabe era prolongar o tempo entre as sessões de IVIG, mas na prática eu acho que não funcionou. Ainda sinto que após 25 dias sem imuno a fraqueza começa a voltar gradualmente. Parece tudo como era antes, imuno a cada 30 dias. 

Foi uma experiência dramática e muito cansativa para a minha história de CIDP. Hoje eu me sinto bem melhor, mas de volta ao que era antes. Continuo aguardando o desenvolvimento de novos tratamentos.

quinta-feira, 24 de abril de 2014

Plasmaférese na Polirradiculoneurite Crônica - Fraqueza

Após a passagem do catéter central e feitos os exames de sangue para verificar os indicadores, veio a plasmaférese propriamente dita.
É importante que o nível de Calcio no sangue seja medido e também o nível de coagulação para que o médico saiba o que esperar das sessões de plasmaférese. Esse procedimento retira o plasma do sangue e com ele as proteínas e fatores de coagulação e o Cálcio, podendo causar hipocalcemia que é a deficiência de Calcio. Para a protrombina se transformar em trombina e cumprir o seu papel na coagulação, o corpo precisa de Cálcio. Durante ou após o procedimento, Calcio pode ser administrado ao paciente para regular a quantidade no sangue.

A máquina de plasmaférese recebe o sangue vindo do corpo por uma das vias do catéter. O sangue passa por uma centrífuga que separa a parte sólida (as hemácias, por exemplo) da parte líquida (plasma). O plasma retirado vai para uma das bolsas de plástico suspensas na máquina e posteriormente é descartado. O novo plasma (no meu caso foi Albumina) é recombinado com as hemácias e está pronto para retornar ao corpo pela outra via do catéter. Junto com a reposição do sangue ao corpo é administrado também o Citrato para compensar o fator coagulante que foi embora com o plasma velho.

Assim são trocados 3,5 litros de plasma de todo o corpo a cada sessão. Todo o procedimento leva umas duas horas e meia.

A parte mais crítica está perto do final quando o corpo começa a sentir mais a falta do Cálcio. O sintoma é a náusea, enjôo. Aconteceu comigo e logo foi administrado o Cálcio, a cama foi colocada numa posição inclinada, com a cabeça mais baixa que os pés para fazer o sangue voltar ao cérebro. Depois de uma hora, mais ou menos, as tonturas passaram e voltei a me sentir bem novamente.

Na segunda sessão, de novo são verificados os indicadores de Cálcio no sangue e a coagulação. Os médicos decidiram administrar o Cálcio logo no começo para evitar a hipocalcemia verificada anteriormente. Tudo correu muito bem, sem náuseas ou tonturas e pude voltar para o quarto mais cedo.

Apesar da plasmaférese ser indicada para o tratamento da Síndrome de Guillain Barré e para CIDP, Polirradiculoneurite Inflamatória Desmielinizante Crônica, não são todos os pacientes que respondem a esse tratamento. Aliás, de acordo com um dos médicos que conheci aqui no hospital, um paciente geralemente responde a apenas um tipo de tratamento: ou imunoglubulinas, ou plasmaférese, ou corticoides (além desses existem outros como azatioprina, rituximabe, ciclofosfamida e outros).

No meu caso não deu certo.

Na primeira sessão eu voltei mais fraco para o quarto. Na segunda sessão ainda mais fraco e o quadro piorou nos dias seguintes: não conseguia mais levantar da cama, andar, levantar os braços e tudo o que tentava fazer me cansava muito. Ficava exausto e ofegante ao tentar me mexer na cama (o que não conseguia fazer sozinho de qualquer maneira). O apetite foi embora e tudo era cansaço.

Foi uma sensação que eu não havia experimentado com essa magnitude antes. Impotência motora! Nem ir ao banheiro sozinho eu podia, ou tomar banho em pé ou sentado, pois não conseguia segurar o sabonete. Foi punk! Mesmo quando tive minha crise em 2010 nos EUA eu não tinha atingido esse nível. Considero que esse foi o "fundo do poço" da minha saúde em todos os tempos.

Graças aos recursos que Deus colocou na minha vida, como um bom hospital e um ótimo médico, Dr Rodrigo Thomaz com quem me trato há oito anos, foi possível avaliar a situação rapidamente e criar uma nova estratégia.

No próximo post vem a recuperação.

sexta-feira, 4 de abril de 2014

Plasmaférese na Polirradiculoneurite - passagem do catéter central


Eu estou escrevendo esse post com as mãos e braços praticamente sem forças. Tenho só o suficiente para apertar a tecla no notebook. Ainda bem que não usamos mais as máquinas de escrever, certamente não conseguiria teclar. Uma tecla por vez, 20 palavras por minuto, eu chego lá.

Eu cheguei ao hospital na terça-feira, programado para fazer a passagem do catéter central e depois iniciar a plasmaférese.

Já fui ao PA de cadeira de rodas, me sentindo muito fraco, mas ainda conseguia levantar da cadeira com muito esforço.

Do PA eu fui para a pré-internação e só fui para o quarto depois das 21 horas (cheguei no hospital às 14:30!). Não dava tempo de fazer mais nada, só no dia seguinte.

Consegui tomar banho sozinho.

Na quarta-feira, em jejum, o laboratório colheu sangue. Depois fui para o raio-X do tórax e voltei para o quarto.

Finalmente, às 11:30 fui para o centro cirúrgico.

Combinei  com a anestesista em tomar anestesia geral quando chegasse na cirurgia, ao contrário de sair do quarto com o Dormonide que me colocaria pra dormir rápido, mas na volta ainda ficaria meio tonto.

Também já tinha conversado com o médico cardiovascular sobre o procedimento. Ele resolveu colocar um catéter com a porta externa ao invés de um com a porta de acesso sob a pele.

Eu comecei a receber o anestésico e logo não vi mais nada.

Depois do procedimento, ainda no centro cirúrgico, eu me lembro da anestesista falando comigo e eu ainda meio grogue, mas acordando. Nunca tinha tomado anestesia geral e nem sido operado. Lembro que sonhei muito, mas não lembro o que foi. Parecia que apenas alguns minutos haviam se passado, mas foram 50 minutos no total.

Fiquei em observação lá mesmo e fui retornando à vida. O local onde fizeram a inserção e manipulação estava doendo muito, nota 7. A dra anestesista prescreveu um pouco de morfina, mas a dor apenas caiu para 5 após 20 minutos. Minha garganta estava seca e arranhando. Fiquei recebendo soro.

Voltei para o quarto e a dor persistia. Acho que era aguentar mesmo e se acostumar.

Na passagem do catéter, o médico insere uma agulha na altura do pescoço para achar a veia cava. No mesmo buraco, ele coloca outra agulha maior com um arame dentro (J-wire) que vai guiar o catéter. Esse arame é deslizado pela veia até chegar próximo do coração. Sobre o arame é colocado um tubo dilatador, para aumentar  o diâmetro do caminho do catéter. Removido o dilator, o catéter é colocado sobre o arame-guia e empurrado para dentro da veia, até a posição correta. O arame-guia é retirado por dentro do catéter, deixando este último no seu lugar. Depois disso, um "túnel" é criado sob a pele por onde o catéter passa até o local onde vai ficar a porta, para fora da pele.

Se você tem estômago para essas coisa, veja os vídeos:

https://www.youtube.com/watch?v=L_Z87iEwjbE&index=7&list=FLU4vwF2GcucmEUNeSCa85yQ

https://www.youtube.com/watch?v=FiDQAfF2TKc&index=5&list=FLU4vwF2GcucmEUNeSCa85yQ

https://www.youtube.com/watch?v=FFLazih03lQ&index=4&list=FLU4vwF2GcucmEUNeSCa85yQ

Eu acho que a manipulação de instrumentos no local onde a inserção é feita foi grande e por isso que continua doendo. Mas, não é tanto assim.

Permcath (ou Permicath)
Na foto da pra ver as duas vias do catéter e o curativo sobre o local onde o catéter entra na pele.
Vai por baixo da pele até o curativo do pescoço. Foi por esse local, no pescoço, que foi feita a inserção e manipulação do catéter. Aí é que dói mais :) A dor é a de um corte na pele e vai sumindo aos poucos.
Uma das dicas é conversar bastante com o seu médico antes do procedimento para saber tudo o que vai acontecer. Eu e o Dr. Sérgio Kuzniec conversamos muito sobre os detalhes do procedimento, os tipos de catéteres, anatomia vascular, riscos, etc. 
Posicionamento das vias do catéter

Ele me falou que o risco maior é na colocação e manipulação do "introdutor" que é uma material rígido, e não na colocação do arame-guia que é flexível e que não "enrosca" em nada. O Dr. falou também que há risco de infecção se o catéter é manipulado para outros fiz diferentes da sua função principal, para administrar medicacões ou colher sangue, por exemplo. Ele disse que uma cultura de bactérias introduzida na manipulação pode se alojar no catéter e permanecer ali por mais tempo, já que o catéter é de uma material artificial. É mais difícil combater essa infecção quando ela é "no catéter". Por isso, é necessário ter cuidado para manipular e também na hora do banho para não molhar.

Esse tipo de catéter pode ser usado por muito tempo. O paciente pode ir para casa e "viver normalmente", observando os cuidados, e voltar depois para receber mais medicações. Alguns ficam com o catéter até mais do que um ano.

Amanhã a Plasmaférese.

terça-feira, 25 de março de 2014

Fampyra e Polirradiculoneurite Crônica

Fampyra é um medicamento relativamente novo, primariamente indicado para esclerose múltipla e que pretende melhorar a locomoção nesses pacientes. O mecanismo de ação é muito interessante.

Os pacientes de CIDP/GBS e esclerose múltipla têm algo em comum: a desmielinização. Em ambas s doenças a camada de mielina dos neurônios que transmitem os impulsos elétricos é destruída em várias porções ao longo dessa célula e resulta que os íons de potássio acabam se dispersando para fora da célula. O pulso elétrico chega enfraquecido ao destino ou se perde completamente.

Pense no nervo como se fosse uma mangueira. Numa pessoa normal, você abre a torneira e a água sai do outro lado. Num paciente de GBS/CIDP e esclerose múltipla, você abre a torneira, mas a mangueira está cheia de furinhos e a água escapa por ali.

Pois é, o Fampyra (fampridina) é um medicamento que tampa os furos por onde os íons escapam, mantendo esses íons dentro da célula de maneira que eles possam levar o impulso elétrico até o destino.

É uma descrição bem leiga. Na verdade é um pouco mais complicado do que isso, mas dá para entender como é o mecanismo.

 
Sem Fampyra

Vejam na figura abaixo que o número de íons escapando é bem menor do o da figura acima.
Os gráficos da figura mostram o "potencial de ação" ao longo da célula. Pense nele como se fosse a "força" do impulso elétrico. Sem Fampyra o potencial cai, com Fampyra ele se mantém.

Com Fampyra

Algumas pessoas têm usado o Fampyra para tentar melhorar a locomoção também na CIDP, inclusive eu.

Os testes feitos com Fampyra (também conhecido como Ampyra) mostram que 34% dos pacientes de Eclerose Múltipla estudados obtiveram melhora. Num outro estudo o número foi ainda maior.

Minha última IVIg foi no dia 7/2/2014. Uma semana depois iniciei com um comprimido de 10 mg de Fampyra por dia e da segunda semana em diante 2 comprimidos. No total, eu tomei por 5 semanas.

Tudo muito bonito, o mecanismo faz sentido, mas…..infelizmente não houve melhora no meu caso. Não senti que estava caminhando melhor.

Os efeitos colaterais no meu caso foram insônia, constipação e infecção urinária.

Não existem, ou eu não consegui achar estudos, sobre Fampyra com CIDP/GBS ou miopatia inflamatória.

Isso não quer dizer que não vá funcionar no seu caso. Fale com o seu médico, mas prepare o bolso! 28 comprimidos de Fampyra custam por volta de R$ 500,00!

Se quiser saber mais sobre o Fampyra, consulte: http://ampyra-hcp.com/hcp/all_about_ampyra/

No link acima você encontra um video muito interessante sobre o mecanismo de ação do Fampyra.




quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Tornozelos Inchados, Pés Inchados na Polirradiculoneurite

por Marcio Pocciotti

Por causa do meu trabalho eu tenho de viajar bastante.
Recentemente fiquei duas semanas nos Estados Unidos para a convenção anual da empresa. Foram duas semanas cansativas e 4 dias de diarreia!
Parece que não tem jeito: é chegar lá e desandar o intestino. Alguma bactéria que rolou pelo evento e me pegou (pegou também outras pessoas). Perda de líquido e de eletrólitos: sódio e potássio.
O problema é que deu muita dor de estômago também. Outro problema é que por causa da diarreia que é muito ácida, a "rosca" ou "última milha" para os técnicos é sempre prejudicada! Toca a procurar remédio: alguma coisa para regular o intestino, gatorade para repor e hidratar, pomadas para hemorroidas e por aí vai.
O maior medo é que os tendões fiquem rígidos e eu pare de andar, como aconteceu no Peru (ver os posts antigos).
Mas, graças a Deus, não chegou a esse ponto e no quinto dia eu estava melhor e deixei de ir ao banheiro a cada 10 minutos. Imagina a "última milha" como estava!

Mas, além disso tudo, a novidade é que os pés estão inchando. Não só isso como também as "juntas" estão doendo, um tipo de artrite mesmo, causada pelo ácido úrico. Fizemos exames há alguns meses e a taxa do ácido úrico estava alta (não sei se ainda continua). O Dr receitou Zyloric diariamente e Colchicina para as crises (com parada do Zyloric).

Os pés e principalmente o tornozelo estão inchando mais e com mais facilidade. O direito está sempre inchado; `às vezes mais, às vezes menos. Mas, com todas essas viagens de avião, inchou mesmo: retenção de líquidos.

Tem a ver com a CIDP? Eu pensei que era por causa da Azatioprina, mas faz mas de um ano que eu não tomo. Concluí, por enquanto, que é causada, não diretamente pela CIDP, mas a CIDP faz muitas mudanças no corpo e agora eu tenho os pés que incham. É fato que a circulação piorou. O Dr já tinha receitado meias de compressão antes; sinal que precisávamos melhorar a circulação. Exercícios para melhorar a circulação, etc. De acordo com relatos, a causa principal é por ficar sentado. Daí a recomendação de levantar a cada duas horas e circular.

Tenho de dormir todos os dias com os pés para cima, pois é a única coisa que faz desinchar mesmo. Quando acordo, o pé está melhor, o tornozelo também, mas o dia vai passando e o pé vai começando a inchar de novo. No fim do dia está inchado. Não dói! Mas tem um aspecto ruim.

Eu procurei nos fóruns da Fundação Internacional de GBS e CIDP e encontrei mesmo vários relatos de pessoas com Polirradiculoneurite Crônica e Síndrome de Guillain Barré que têm pés e tornozelos inchados. A conclusão que chegaram é que devemos elevar os pés a uma altura acima do coração. Alguns ficam um tempo deitados no sofá, com os pés nos braços do sofá. Outros na cama com os pés sobre um pilha de travesseiros.

De uma maneira geral o corpo parece que vai definhando; coisas que não aconteciam passam a acontecer, dores novas, dúvidas quanto à relação que têm com a CIDP…

Outro dia eu não conseguia nem mexer o dedão do pé direito. Pensei que tinha perdido os movimentos. Ficou assim por 24 horas e depois consegui mexer um pouco. Também sinto que o meu pé direito está mais "caído do que antes" e tenho que arrastá-lo mais do que antes. Mas ainda consigo andar.

Acho que daqui o único movimento é para baixo, a não ser que consigamos alguma nova medicação. As imunoglobulinas me mantém de pé e andando, mas não curam. Significa que o corpo vai perecendo naturalmente e ainda tem de ir lidando com os efeitos secundários como a atrofia dos músculos, compensação do esqueleto por causa do pé caído, compensação da coluna, etc…

Cura, venha logo!